Por: Alberto Consolaro
A posição da cabeça do feto pode atrapalhar a formação da mandíbula. Quando dobrada para a frente, faz o futuro “queixo” tocar a região peitoral fetal ou proeminência cardíaca. Com o tempo, haverá espaço suficiente e o feto levanta a cabeça, liberando a mandíbula para crescer para a frente e para baixo. Esse movimento é essencial!
O crescimento da mandíbula permite que a língua ocupe seu espaço à frente e abaixo. Vai se criando condições locais para formar o palato e a maxila, na parte média e inferior da cabeça.
Se não levantar a cabeça, a mandíbula não vai crescer e não dará espaço para a língua. A mandíbula vai ficar diminuída e a língua muito para traz e para baixo, dificultando a respiração e alimentação, colocando em risco a vida do recém-nascido.
Palato e maxila não terão espaço para desenvolver seu tamanho e forma normal. O palato pode ficar arqueado bem alto ou não se formar por completo, gerando-se uma fissura palatina. Com mandíbula e maxila pequenas, vai faltar espaço para os dentes que terão posições diferentes e oclusão alterada.
Tudo foi consequência da posição fetal e não foi herdado. A falta do movimento da cabeça para frente e para cima, deu início a uma “sequência” de anomalias múltiplas. Tal como acontece com as pedras de dominó posicionadas verticalmente uma ao lado da outra; se uma cair todas as outras cairão. As características da Sequência de Pierre Robin são: micrognatia, glossoptose (posição lingual na hipofaringe com obstrução respiratória ou queda da língua), palato ogival, fundo ou arqueado e fissura palatina em forma de “U”.
A SEQUÊNCIA E O GÊNIO
Foi observada por Pierre Robin (1866-1950) um cirurgião-dentista, professor, estomatologista e cirurgião de Paris, a partir de uma série de artigos sobre a micrognatia e a retração da língua iniciada em 1923. Ele observou que adultos jovens com maxilares pequenos apresentavam obstrução das vias aéreas superiores durante o sono. Ele demonstrou que adultos com mandíbulas pequenas tinham uma série de efeitos dentários e mal oclusão, além de sérios problemas médicos sistêmicos, incluindo o que veio ser conhecido como Apneia Obstrutiva do Sono.
Em recém-nascidos e crianças pequenas, Pierre Robin foi o pioneiro na compreensão dos efeitos de mandíbulas pequenas desde o nascimento e como a glossoptose pode levar até a morte espontânea ou inesperada de bebês durante o sono, o que hoje é a morte súbita no berço ou Síndrome da Morte Súbita Infantil. Pierre Robin foi pioneiro ao reconhecer que bebês em risco deitados de costas, potencializavam a obstrução das vias aéreas superiores, engasgando-se com a “língua caída”. Seus conselhos sobre técnicas de sono e alimentação em decúbito ventral ou de bruços, foram amplamente adotados. Suas observações foram geniais.
REFLEXÕES FINAIS
1. A Sequência de Pierre Robin não é síndrome. Síndrome são anomalias múltiplas simultâneas que caracterizem uma doença e que tem causa conhecida. Um exemplo é Síndrome de Down. Quando se tem várias alterações que se repetem caracterizando uma doença, mas não se conhece a causa, estas anomalias múltiplas são chamadas de Associação. E se as anomalias múltiplas ocorrem em sequência e em consequência uma da outra, teremos a Sequência.
2. A Sequência de Pierre Robin é muito frequente entre nós e o diagnóstico tardio pode levar ao óbito. A incidência da Sequência de Pierre Robin varia de 5,3 a 22,7 casos por 100.000 nascimentos, mas infelizmente, ainda é pouco conhecida, mesmo entre os profissionais.
3. Seu tratamento requer transdisciplinaridade dos profissionais de saúde envolvidos. Equipes devem ser formadas para o diagnóstico e tratamento quanto mais precoce for possível. Para isto se requer conhecimento e aplicação de protocolo que poderiam ser induzidos pelas Secretarias de Saúde em todos os estados.