Na fronteira do México com os Estados Unidos, Los Algodones é um fenômeno peculiar: uma cidade de apenas 10 mil habitantes, onde um a cada dez moradores é dentista. Conhecida como a “Capital Mundial dos Dentistas” ou “Cidade do Dente”, o município se tornou referência em atendimento odontológico, atraindo entre três e cinco mil visitantes norte-americanos diariamente. A história foi contada em um artigo publicado pela BBC.
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A prefeita Herminia Marín, que também é dentista, confirma os números impressionantes que explicam a fama da cidade. “É uma cidade pequena, mas muito dinâmica. Atendemos milhares de pessoas todos os dias”, disse ao repórter Daniel Pardo, da BBC Mundo no México. A localização estratégica, aliada à alta concentração de profissionais, transformou Los Algodones em um destino obrigatório para quem busca tratamentos odontológicos de qualidade a preços acessíveis.
A história de Los Algodones remonta ao início do século XX, quando a cidade prosperava graças à produção de algodão — daí seu nome. O auge veio durante a Segunda Guerra Mundial, com a alta demanda pela fibra. No entanto, a partir dos anos 1970, a indústria têxtil entrou em declínio, forçando a economia local a se reinventar.
“Todas as cidades do norte do México, sem exceção, recebem um grande volume de demanda de serviços médicos dos Estados Unidos. Mas em Los Algodones isso é ainda mais perceptível”, explicou José Zavala, engenheiro e especialista em desenvolvimento do Colégio de la Frontera, em Tijuana, à BBC. Segundo ele, a concentração de aposentados na região norte-americana próxima favoreceu ainda mais o crescimento da cidade como polo de turismo médico.
Apesar das tensões políticas, como as tarifas comerciais impostas durante o governo Trump e as políticas de imigração mais restritivas, a relação econômica entre os dois lados da fronteira permanece sólida. “As tarifas são um obstáculo, mas a relação econômica é muito difícil de ser rompida”, garantiu Zavala.
A busca pelo sorriso perfeito
Entre os profissionais pioneiros de Los Algodones está Carlos Rubio, que abriu seu primeiro consultório nos anos 1980. Hoje, dono de uma sofisticada clínica odontológica, Rubio vê no sistema de saúde norte-americano uma oportunidade de crescimento contínuo para o setor.
“O sistema de saúde dos Estados Unidos não é social. Cerca de 60% da população não tem seguro odontológico ou possui uma cobertura limitada”, afirmou a Pardo. De acordo com a Associação Odontológica Americana, um terço dos adultos entre 19 e 64 anos não possui seguro dental. Mesmo entre aqueles que têm, a cobertura muitas vezes limita-se apenas a limpezas ou check-ups básicos.
Isso obriga muitos estadunidenses a enfrentarem custos altíssimos para tratamentos mais complexos — ou buscar alternativas mais baratas no México. Segundo Rubio, o perfil dos pacientes é variado, mas há uma preferência marcante: “Eles adoram aquele sorriso extremamente branco, quase descolorido”, brincou uma das assistentes da clínica.
Turismo odontológico e cultural
A dinâmica em Los Algodones vai além dos consultórios. Durante o inverno, é comum ver filas de norte-americanos atravessando a fronteira a pé, vindos de estacionamentos gigantescos na divisa. Esses visitantes são conhecidos localmente como “los ángeles de la nieve” (“anjos da neve”) ou “las aves migratorias” (“aves migratórias”), em referência aos aposentados que fogem do frio do norte dos EUA.
Além de tratamentos odontológicos, os turistas aproveitam a estadia para saborear margaritas, comer tacos e curtir a hospitalidade local. É o caso de Nancy Nelson, moradora de Wisconsin, que desde há 25 anos visita Los Algodones para cuidar da saúde bucal. “Eles são muito gentis e compreensivos com meu medo de dentista”, contou à BBC, enquanto aguardava para atravessar a imigração de volta aos EUA.
Nancy e seu marido, Bruce, fazem da viagem uma oportunidade de lazer e economia. “Voamos do Arizona para cá, alugamos um carro, ficamos algumas noites, fomos ao dentista, economizamos milhares de dólares e ainda aproveitamos umas férias”, relatou Bruce.