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Reabsorção radicular apical de dentes tratados e não tratados endodonticamente após movimentação ortodôntica: uma avaliação radiográfica

Resumo

A reabsorção radicular, expressa, geralmente, como um arredondamento apical, é um dos achados mais comuns da clínica ortodôntica.

Objetivo: avaliar radiograficamente se há similaridade na reabsorção radicular apical encontrada em dentes tratados e não tratados endodonticamente quando submetidos à terapia ortodôntica.

Métodos: foram estudados 28 pacientes que apresentavam um incisivo central superior tratado endodonticamente (grupo experimental) e seu homólogo vital (grupo controle) antes do início da movimentação ortodôntica. A mensuração foi realizada comparando-se as radiografias periapicais pré e pós-tratamento ortodôntico.

Resultados: não houve diferença estatisticamente significativa (p > 0,05) quanto à reabsorção radicular apical entre os dentes endodonticamente tratados ou não.

Conclusão: o tratamento endodôntico não interfere no processo de reabsorção apical decorrente da movimentação ortodôntica.

Palavras-chave: Reabsorção radicular. Tratamento ortodôntico. Endodontia. Reabsorção apical.

Introdução

A movimentação de dentes tratados endodonticamente tem se tornado mais comum devido ao aumento de pacientes adultos na clínica ortodôntica. Numerosos estudos têm sido feitos para avaliar a reabsorção radicular em dentes vitais, sendo demonstrado que praticamente todos os dentes submetidos ao tratamento ortodôntico apresentam algum grau de reabsorção radicular externa1-9; entretanto, poucas pesquisas envolvem de uma forma controlada o tratamento ortodôntico sobre dentes endodonticamente tratados10,11.

Diversas variáveis têm sido atribuídas como fatores predisponentes à reabsorção radicular, incluindo a genética, fatores anatômicos, tempo de tratamento e a mecânica aplicada5,12 . Também tem sido ressaltada a importância de fatores locais, como a morfologia radicular e da crista óssea alveolar6,13,14,15. Alguns não comprovam a correlação com distúrbios endócrinos e susceptibilidade individual13,14,15. Já o uso de forças intensas e o tratamento prolongado estão diretamente relacionados a um aumento da reabsorção radicular associada à Ortodontia, sendo esses riscos bem conhecidos pelos ortodontistas4,5,12,15.

Apesar dos dentes endodonticamente tratados responderem à aplicação de forças de maneira similar aos dentes vitais durante a terapia ortodôntica, há uma controversa e escassa literatura a respeito. Wickwire et al.13 reportaram que dentes desvitalizados estavam sujeitos a um maior grau de reabsorção radicular na movimentação ortodôntica do que dentes vitais. Por outro lado, em um estudo radiográfico, Spurrier et al.10 descreveram uma menor susceptibilidade à reabsorção radicular em alguns dentes tratados endodonticamente, apesar de não encontrarem diferenças entre os dois grupos. Em modelos animais, parece não haver diferença significativa entre a reabsorção radicular externa na terapia ortodôntica em dentes vitais e desvitalizados17,18,19. Em um estudo prévio também não encontramos diferenças entre as reabsorções ocorridas durante o tratamento ortodôntico em incisivos centrais superiores endodonticamente tratados ou não11.

O objetivo do presente estudo foi avaliar, radiograficamente, se há diferença significativa na reabsorção radicular apical encontrada em dentes vitais e endodonticamente tratados que passaram por terapia ortodôntica.

Material e Métodos

Foram selecionados 28 pacientes que possuíam um incisivo central superior vital e seu homólogo endodonticamente tratado, sendo que, nesse último, o ligamento periodontal da região apical apresentava-se intacto. Essa seleção envolveu a revisão de aproximadamente 3.500 registros ortodônticos de três clínicas de Ortodontia particulares. Portanto, 56 incisivos foram avaliados, 28 tratados endodonticamente (grupo experimental) e 28 vitais (grupo controle). Todos os pacientes selecionados sofreram movimentação ortodôntica, utilizando aparelhos fixos, por um período mínimo de 6 meses. As intervenções endodônticas dos incisivo haviam sido realizadas há pelo menos um ano do início do tratamento ortodôntico.

Os pacientes que apresentaram coroas com alterações de tamanho devido a procedimentos restauradores foram excluídos do estudo, assim como pacientes com histórico de trauma atingindo a área estudada.

As radiografias periapicais pré- e pós-tratamento utilizadas para a mensuração dos dentes foram digitalizadas (scanner HP Photo Smart, EUA) e avaliadas por meio da ferramenta “Dimensão paralela” do programa CorelDraw 11. As imagens foram ampliadas em 350% para melhor visualização. Todos os dentes foram medidos em seu maior comprimento, da incisal ao ápice radicular, antes e após a movimentação ortodôntica (Fig. 1A).

Para minimizar possíveis distorções da radiografia pré- para a pós-tratamento, mediu-se, também, a maior distância da incisal à junção amelocementária de todas as radiografias (Fig. 1B), e calculou-se as diferenças para determinação do fator de encurtamento/alongamento, como preconizado por Spurrier et al.10

Todas as medições foram repetidas quatro vezes, com intervalos de uma semana. Foi utilizada a média aritmética entre as quatro avaliações para as comparações entre os grupos. O teste t de Student para dados pareados foi utilizado adotando-se 5% de significância.

Resultados

A Tabela 1 apresenta os resultados da reabsorção radicular apical expressa em milímetros. Doze pacientes (42,8%) apresentaram uma maior reabsorção radicular apical no dente tratado endodonticamente quando comparado ao seu homólogo vital, enquanto os demais 16 pacientes apresentaram maior reabsorção no dente vital; entretanto, a média dos dados não revelou diferença estatística (Tab. 2).

Os valores da média, desvio-padrão, erro-padrão e p-valor obtidos a partir da mensuração das radiografias dos dentes vitais e endodonticamente tratados estão expressos na Tabela 2. Comparando-se as radiografias pré- e pós-tratamento (T1 e T2), tanto dos dentes vitais quanto dos endodonticamente tratados, observa-se que houve aumento da reabsorção decorrente do tratamento ortodôntico (p < 0,001). Entretanto, quando se compara a reabsorção entre os grupos, não houve diferença estatisticamente significativa (p > 0,05).

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Discussão

A reabsorção radicular de dentes vitais como uma complicação da terapia ortodôntica tem sido muito discutida e estudada. Segundo alguns estudos4,5,12,14,15,16, fatores etiológicos que podem contribuir para uma reabsorção radicular externa incluem: fatores anatômicos, quantidade de força aplicada, tipo de movimento, entre outros.

Entre os 56 dentes submetidos à Ortodontia e analisados no presente estudo, somente em dois deles (vital do paciente 7 e endodonticamente tratado do paciente 10) não houve reabsorção radicular apical (Tab. 1). A comparação entre as médias pré- e pós-tratamento ortodôntico demonstraram diferenças estatisticamente significativas em ambos os grupos (Tab. 2), comprovando a ocorrência de reabsorções apicais decorrentes da movimentação induzida, em concordância com a literatura1,7,19. Vale ressaltar que, no presente estudo, o fato de comparar incisivos homólogos cria uma amostra diferenciada, pois ambos passaram pelo mesmo tipo e tempo de movimento e apresentavam anatomias parecidas intraindivíduo, reduzindo o peso dessas variáveis.

Não houve diferença significativa quanto à reabsorção radicular apical observada radiograficamente nos dentes tratados e não tratados endodonticamente frente à movimentação ortodôntica (Tab. 2). Esses achados são semelhantes aos encontrados por Spurrier et al.10 ao avaliarem 43 pacientes utilizando um método de avaliação radiográfica semelhante, com a ressalva que esse autor descreve que em alguns casos de dentes tratados endodonticamente as reabsorções foram menores, como se protegidos, creditando isso à possível maior densidade mineral e ao maior grau de dureza, sem, no entanto, submeterem os dentes a testes para verificar essas características15. Mattison et al.18 também concluíram que a ausência da polpa vital em um dente endodonticamente tratado não o predispõe à reabsorção radicular, mesmo quando submetido a forças ortodônticas.

Em modelos animais também não há diferenças entre os aspectos macro e microscópico de dentes vitalizados e com Endodontia realizada, que foram movimentados com Ortodontia17,18. Mah, Holland e Pehovich19 relataram que, microscopicamente, os dentes de doninhas tratados endodonticamente exibiram maior perda de cemento quando comparados com dentes vitais, embora radiograficamente não se observassem diferença estatisticamente significativa entre o comprimento radicular dos dois grupos.

Steadman20 havia relatado que em secções histológicas de áreas de reabsorções de raízes desvitalizadas houve uma semelhança ao encontrado em reações tipo corpo estranho, sugerindo que dentes endodonticamente tratados agiriam como um corpo estranho, causando irritação crônica e, dessa forma, estariam mais suscetíveis à reabsorção radicular. Essa reação não costuma ser observada em dentes corretamente obturados, podendo acontecer em casos de dentes sobreobturados ou em que o limite da obturação se deu no forame apical15. Wickwire et al.13 também tinham reportado haver uma maior frequência de reabsorção radicular em dentes desvitalizados quando comparados a dentes vitais, mas o método utilizado por esse autor foi criticado, pois os dentes endodonticamente tratados haviam sido previamente traumatizados, o que implicaria por si só em um aumento da susceptibilidade à reabsorção15,18,21.

Diante dos dados do presente estudo, bem como da literatura acerca da reabsorção apical durante a movimentação induzida ortodonticamente1,9,22,23, indica-se uma adequada investigação da etiologia do tratamento endodôntico, descartando-se a ligação com trauma prévio. Também indica-se investigar o histórico de trauma nos próprios dentes vitais15,21. Caso contrário, o ortodontista pode executar a movimentação sem a preocupação de maior dano radicular.

Conclusão

Dentes tratados e não tratados endodonticamente (sem histórico de trauma) que passaram por terapia ortodôntica apresentam reabsorção apical semelhante diante da movimentação dentária induzida.

Como citar este artigo: Esteves T, Ramos AL, Hidalgo MM. Apical root resorption of vital and endodontically treated teeth after orthodontic treatment: A radiographic evaluation. Dental Press Endod. 2013 Sept-Dec;3(3):69-73.

» Os autores declaram não ter interesses associativos, comerciais, de propriedade ou financeiros, que representem conflito de interesse, nos produtos e companhias descritos nesse artigo.

» O(s) paciente(s) que aparece(m) no presente artigo autorizou(aram) previamente a publicação de suas fotografias faciais e intrabucais, e/ou radiografias.

Endereço para correspondência: Tarso Esteves

E-mail: tarsoorto@gmail.com

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