Dental Press Portal

Maxilares podem ser menores ou hipoplásicos, mas “atrésicos” é impreciso!

Alberto Consolaro é um dos autores do artigo

Insight Ortodôntico, por Alberto Consolaro e Renata Bianco Consolaro.

RESUMO: Para induzir reflexões e discussões sobre o uso adequado da nomenclatura em Ortodontia e Patologia, para os casos em que a maxila e a mandíbula apresentam-se pequenas ou menores do que o habitual, ou seja, anômalas, comparou-se o significado conceitual do termo “atrésica”. Esse termo não é adequado quando aplicado à maxila e à mandíbula para identificar situações em que houve um desenvolvimento com crescimento insuficiente para se chegar ao tamanho normal. Para identificar maxila e mandíbula menores, é mais adequado e preciso o uso do termo maxila ou mandíbula hipoplásica. Isso porque atresia representa uma anomalia por obstrução da luz ou lume em órgãos ocos, o que não ocorre na maxila ou na mandíbula. Maxila ou mandíbula hipoplásica também podem ser chamadas, apropriada e especificamente, de micrognatia.


Os distúrbios do desenvolvimento são alterações que ocorrem durante a formação do indivíduo. O desenvolvi-mento, em boa parte, continua depois do nascimento até que se complete o ciclo do tempo em que se forma o corpo humano. Na Odontologia, convencionou-se que o desenvolvimento dos maxilares, muitas vezes chamado de crescimento, termina ao redor de 22-24 anos, variando entre os indivíduos e, especialmente, entre mulheres e homens.

QUANDO É ANOMALIA, DISPLASIA OU DEFORMIDADE?
Pode-se dividir o desenvolvimento humano em três períodos distintos:

1º) Período Pré-Embrionário: estende-se do 13º ao 21º dia depois da fecundação, quando ocorre a gastrulação, na qual as células embrionárias se diferenciam e organizam-se em três populações diferentes conhecidas como folhetos germinativos: ectoderma, mesoderma e endoderma. Nesse período, predomina a lei do tudo ou nada: quando atua algum agente teratogênico, produz-se o aborto; o pré-embrião dificilmente sobrevive.

2º) Período Embrionário: é a fase mais crítica e suscetível à ação de agentes internos e externos pois: 1. Caracteriza-se pela ocorrência de inúmeras mitoses e diferenciações celulares e 2. Termina no começo do terceiro mês, período em que boa parte das mulheres não sabe ainda que está grávida.

Nesse período, os órgãos e tecidos estão sendo definidos, com muita mobilização celular — que, no conjunto, se chama organogênese. Anomalias ou malformações são os nomes que se dá aos distúrbios do desenvolvimento que ocorrem nessa fase, comprometendo número, tamanho e forma de tecidos e órgãos, quase sempre de forma significativa e importante.

As anomalias podem ser simples quando afetam um tecido ou órgão. Porém, o agente causador pode atuar em vários tecidos e partes ao mesmo tempo, promovendo anomalias múltiplas, classificadas como síndromes, associações e sequências, dependendo de alguns critérios.

Do ponto de vista morfológico e conceitual, as anomalias ou malformações podem ser por: 1) Incompletude do órgão ou tecido, 2) Redundância ou 3) Aberração. Algumas das anomalias por incompletude são exemplificadas a seguir, recebendo nomes como:

» Agenesia: representa o grau máximo, caracterizado pela ausência completa de desenvolvimento do órgão como na agenesia renal e na anodontia.

» Aplasia: caracteriza-se pela formação apenas dos rudimentos dos órgãos, mas totalmente afuncionais. Do ponto de vista fisiológico, a aplasia tem o mesmo efeito que a agenesia.

» Hipoplasia: consiste no insuficiente desenvolvimento do órgão, sem comprometimento total da função. Tratam-se de órgãos deficientes no tamanho, como na hipoplasia renal, que produz rins estruturalmente deficientes, mas funcionais. A hipoplasia do esmalte mostra redução na quantidade e qualidade do tecido. A hipoplasia mandibular resulta em mandíbulas reduzidas no tamanho, mas permite uma vida quase normal, sendo ainda passível de correção cirúrgica, ortopédica e/ou ortodôntica.

» Atresia: é a insuficiência ou falta do desenvolvimento de lumes, luz em órgãos ocos como o tubo digestivo, traqueia e ductos excretores, cujos esboços embrionários eram maciços.

» Estenose: estreitamento pontual de estruturas ocas como ductos, condutos ou orifícios naturais. O distúrbio funcional resultante será uma obstrução parcial.

» Persistência: representa uma falha na regressão de estruturas embrionárias transitórias, como o divertículo de Meckel, ducto tireoglosso e lâmina dentária. Os remanescentes ou estruturas vestigiais persistentes, na forma de ilhotas, cordões ou fragmentos teciduais, podem dar origem a lesões indesejadas, como o cisto do ducto tireoglosso, cistos e neoplasias odontogênicas.

3º) Período Fetal: a partir do início do terceiro mês até o nascimento, os tecidos iniciam um processo de maturação estrutural e capacitação funcional também chamado histogênese (Fig. 1). No início do período fetal, o indivíduo em formação já consegue ter uma forma semelhante à sua espécie e, por isso, passa a ser identificado como feto. Antes disso, era um embrião, no qual não se define ainda a forma da espécie de origem.

Quando ocorrem alterações nesse período, os tecidos formados são afetados, especialmente, na sua maturação organizacional e capacidade funcional, e essas alterações passam a ser chamadas de displasias. Na displasia fibrosa dos maxilares, por exemplo, o tecido se forma, mas é desorganizado e com dificuldades funcionais para cumprir a missão do osso. Os tecidos também podem se formar de forma muito exagerada, como ocorre na macrognatia, o que corresponde a uma displasia simples, por envolver apenas um único tecido. As displasias podem ser simples, mas há, ainda, as do tipo hamartoplasia e heteroplasia.

Na etapa final do período fetal, quanto quase tudo está formado, mas ainda se formatando em definitivo, as partes anatômicas podem sofrer pressões, tensões, compressões e falta de movimentos no espaço uterino. Isso pode provocar deformidades no formato final daquela região. Membros podem ficar tortos, pés posicionados de forma inadequada ou o crânio amassado. Esses distúrbios do desenvolvimento são conhecidos como deformidades. Pode-se afirmar que displasias e deformidades são distúrbios do período fetal, pois a histogênese foi comprometida.


QUAL É O PERÍODO DE TEMPO PARA CADA TIPO DE DISTÚRBIO?

Os tipos de distúrbios do desenvolvimento e o tempo de formação intrauterina podem ser determinados e previsíveis. No entanto, depois do nascimento, muitos tecidos ainda estão em fase embrionária e fetal, ou seja, em organogênese e histogênese, respectivamente.

Um exemplo disso são os dentes, os quais, muitos, ainda nem tiveram seus botões formados, ou seja, ainda estão como embriões e fetos. Do mesmo modo, certas partes dos maxilares ainda estão se desenvolvendo, para se chegar aos tecidos craniomandibulares de um adulto. Em alguns casos, um agente externo pode agir e modificar sua formação.

Por exemplo: 1) Quando a sucção do dedo promove uma alteração no crescimento mandibular, ocorre uma deformidade. 2) Quando a mandíbula cresce além do tamanho relacionado corretamente com a maxila, a macrognatia corresponde a uma displasia simples. 3) Em muitos casos, a falta de uma relação proporcionalmente adequada entre os maxilares por posicionamentos incorretos, e não por tamanhos discrepantes, corresponde à deformidade. 4) O lábio fissurado ocorre entre a quarta e a oitava semanas de vida intrauterina, e constitui uma anomalia ou malformação.

Mais exemplos: 1) A anodontia parcial ou os dentes supranumerários são anomalias ou malformações dentárias. 2) A dilaceração radicular é uma deformidade. 3) A fluorose e as manchas brancas do esmalte não cariosas são anomalias do tipo hipoplasia. 4) O dente invaginado ou dens in dente é uma displasia dos tecidos dentários.

Em suma: em alguns tecidos e órgãos, os períodos embrionário e fetal podem se iniciar e/ou se estender fora desses tempos clássicos, mesmo que depois do nascimento. Um corpo humano pode ser considerado completamente formado depois 22 a 24 anos.

 

– Artigo publicado originalmente na Dental Press Journal of Orthodontics v23n5. Leia o artigo completo aqui.

Sair da versão mobile