Dental Press Portal

Pesquisa da Unicamp aponta desigualdade racial nas condições de saúde bucal na cidade de Campinas

Com o título de “A boca travada no racismo: desigualdades raciais nas condições de saúde bucal”, uma pesquisa do Centro Colaborador em Análise de Situação de Saúde (CCAS) da Faculdade de Ciências Médicas (FCM) da Unicamp – realizada a partir de dados do Inquérito de Saúde do Município de Campinas (ISACamp) – trouxe à tona a necessidade de discutir o racismo nas questões de saúde bucal.

Parte de uma tese de Ph.D., realizada pela cirurgiã-dentista Lívia Helena Terra e Souza, sob a orientação da epidemiologista Margareth Guimarães Lima, a pesquisa avaliou as condições de saúde e o uso de serviços odontológicos segundo a raça, cor da pele e gênero, bem como a associação destes determinantes com dificuldades de mastigar e sorrir, e perda dentária.

No total, foram analisados os dados de 3.021 pessoas, com idade entre 10 e 100 anos, durante os anos de 2014 e 2015 na cidade de Campinas – SP. A primeira publicação decorrente da tese mostrou que as consultas ao dentista, autoavaliadas como ruins, ou com indicação para exodontia dentária (extração) foram mais prevalentes entre os pacientes negros. “Os resultados obtidos são indicativos do racismo que evidenciamos, cotidianamente, na cultura brasileira”, afirma Lívia.

O segundo artigo, submetido à revista Plos One, mostrou de forma alarmante, que a chance de perda dentária da população feminina, autodeclarada preta e parda, foi duas vezes maior que a identificada entre os homens brancos. “Os resultados podem indicar uma tendência de atenção à saúde bucal baseada na tomada de decisão mutiladora em negros e pardos, afetando, principalmente, as mulheres negras”, disse a pesquisadora.

A pesquisa mostrou que a perda dentária é 19% mais frequente entre as mulheres negras do que entre homens brancos. Entre as mulheres, é 26% mais frequente em negras do que em brancas. Entre os participantes negros e pardos, é 14% mais frequente em mulheres do que em homens. As mulheres negras são as mais afetadas, seja qual for o parâmetro.

Ainda de acordo com Lívia em sua pesquisa, na contramão do que preconiza os princípios de igualdade e equidade no Sistema Único de Saúde, de acesso universal, integral e gratuito à saúde, as desigualdades raciais em saúde bucal, infelizmente, ainda estão travadas e são latentes. “Os resultados apontam para o racismo estrutural também no cotidiano da saúde bucal, uma vez que, mesmo que sob condições socioeconômicas controladas, foi possível verificar piores condições de saúde bucal nos negros em relação aos brancos”, afirma.

No caminho de desconstrução do racismo em saúde bucal, cuja pesquisa mostrou ser evidente e silencioso, enfrentar a questão com transparência é o caminho apontado como o mais ideal. “O debate aberto e, sobretudo, as ações de combate às inequidades, são inevitáveis”, conclui a especialista.

Sair da versão mobile