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Deformação dos elásticos em cadeia em relação à quantidade e ao tempo de estiramento

Objetivo: verificar a possível relação entre o grau de estiramento e a consequente deformação permanente dos elásticos em cadeia, bem como se o fator tempo de estiramento tem influência sobre o grau de deformação permanente.

Métodos: segmentos de 5 elos de elásticos em cadeia curta da Unitek/3M foram estirados em de 10 a 100% de seu comprimento original, em dispositivos especialmente idealizados para essa finalidade, permanecendo submersos em saliva artificial a 37 ± 1°C e removidos, sequencialmente, após uma, duas, três e quatro semanas. Quando de sua remoção, para se avaliar o grau de deformação permanente, cada segmento era medido e os valores registrados submetidos à análise estatística.

Conclusão: pode-se concluir que a deformação permanente foi diretamente proporcional ao grau de estiramento dos elásticos em cadeia avaliados, onde os percentuais médios encontrados foram de 8,4% com 10% de estiramento, ultrapassando o percentual de 20% (21,3%) quando distendidos em 40%, chegando a 56,6% de deformação permanente se estirados em 100% de seu comprimento original. Por fim, o maior percentual de deformação permanente ocorreu durante a primeira semana, não sendo estatisticamente significativo após esse período.

Palavras-chave: Elastômeros. Estiramento. Deformação permanente.

 

 

INTRODUÇÃO E REVISÃO DE LITERATURA

Entre os vários sistemas de força utilizados em Ortodontia, com o objetivo de promover a movimentação do elemento dentário, o mais fisiologicamente possível, através do osso alveolar, os elásticos em cadeia são, indubitavelmente, os mais utilizados na clínica diária14,15. Sua inserção e sua remoção exigem um tempo clínico menor, não há necessidade de cooperação do paciente, são de baixo custo e possuem compatibilidade com os tecidos bucais8. Por sua vez, quando distendidos, geram energia potencial elástica capaz de se transformar em energia mecânica, o que produz o movimento dentário. Por serem polímeros amorfos feitos à base de poliuretano, apresentam características tanto de borracha quanto de plástico, sendo marcante sua elasticidade5.Os polímeros são compostos por ligações primárias e secundárias, com fraca atração molecular, apresentando inicialmente um padrão espiral que, com a aplicação de força, se deforma, fazendo com que as cadeias elastoméricas sejam dispostas linearmente por meio de ligações cruzadas. As fracas ligações secundárias permitem a modificação do padrão de espiral para linear, enquanto a recuperação da estrutura inicial se torna possível por meio das ligações cruzadas16. Sua deformação permanente ocorre quando o polímero é distendido acima de seu limite elástico, fazendo com que ocorra o rompimento das ligações cruzadas. No entanto, existem fatores que influenciam o desempenho dos elásticos em cadeia, como o rápido decréscimo da magnitude de força após seu estiramento, ou seja, a incapacidade de desenvolver magnitude de força contínua por um longo período de tempo, resultando em uma perda gradual de efetividade1,3,7,13,14,16. Além disso, os elásticos em cadeia são influenciados por variações de temperatura, do pH salivar e da quantidade de distensão a que são submetidos14. Em meio bucal absorvem água e saliva, pigmentam-se e, consequentemente, passam a sofrer degradação química, gerando o enfraquecimento das forças intermoleculares e decompondo suas ligações internas, o que leva ao início dos processos de degradação de força, de falta de estabilidade dimensional e de deformação permanente, o que dificulta determinar a magnitude de força real que será transmitida ao elemento dentário3. Assim sendo, o presente trabalho propõe-se a avaliar, in vitro, a possível relação entre o grau de estiramento e a consequente deformação permanente dos elásticos em cadeia, bem como verificar se o fator tempo de estiramento tem influência no grau de deformação permanente apresentado.

 

MATERIAL E MÉTODOS

Para a realização dessa pesquisa foram utilizados elásticos em cadeia curta, na cor cinza (CK Spool Chain, Unitek/3M), cuidadosamente seccionados em segmentos de cinco elos, com comprimento inicial de 10mm, desprezando-se os dois elos das extremidades, cuja função era apenas possibilitar o estiramento do elástico. Quatro placas de acrílico foram confeccionadas e perfuradas para que fossem inseridos 20 pinos de aço inoxidável com 0,2cm de diâmetro e 1,5cm de comprimento, dispostos paralelamente em dez pares, com a distância entre si aumentando de 1,0 em 1,0mm, iniciando com 1,1cm e terminando com 2,0cm. A cada par de pinos (Fig. 1) foram encaixados com o auxílio de uma pinça Mathieu dez segmentos de elásticos em cadeia, sendo distendidos de 10 a 100% de seu comprimento original. Para evitar qualquer aproximação dos pinos por causa da tensão produzida pelo estiramento dos elásticos, foi adaptado, entre todos os pares de pinos, um pino de igual comprimento à distância existente entre eles. As placas eram submersas em um estojo de aço inoxidável contendo saliva artificial, com a seguinte composição: cálcio 1,5 mmol L-1, fosfato 0,9mmol L-1, KCL 150mmol L-1 em tampão cacodilato 0, mol L-1 pH 7.0 e flúor 0,05mg/ml (1,1mL de solução/mm2). Tal estojo era mantido fechado e em banho-maria a 37 ± 1°C em uma banheira de imersão. As referidas placas foram previamente identificadas com caneta para retroprojetor preta, de acordo com a duração do experimento. Cabe ressaltar que o nível da água era mantido abaixo da tampa de aço inoxidável, evitando a contaminação da saliva artificial. Posteriormente, as placas eram sequencialmente removidas de lá após uma, duas, três e quatro semanas. Retirado da saliva e seco com papel absorvente, cada segmento de elástico era encaixado em um dispositivo de medição especialmente confeccionado para essa finalidade, constituído por um pino fixado a uma base de madeira, recoberta por um papel milimetrado (Fig. 2). Uma das extremidades do elástico em cadeia era encaixada no pino e seu comprimento final registrado no papel milimetrado. Em seguida, com um paquímetro, o comprimento de cada cadeia elástica era medido e registrado. A cada semana a saliva artificial era substituída, sendo essa pré-aquecida em um recipiente até 37 ± 1°C, evitando-se, assim, variações de temperatura.

Os dados obtidos foram analisados estatisticamente por meio da Análise de Covariância (ANCOVA) com o objetivo de verificar se existia diferença estatisticamente significativa entre o tempo e o grau de estiramento, adotando-se o nível de 5% de significância (p = 0,0556) para identificar possíveis diferenças entre os grupos.

Imagem_Fig01

RESULTADOS

De forma geral, pôde-se verificar que a deformação permanente dos elásticos em cadeia foi proporcional ao aumento do estiramento (Tab. 5). No entanto, verificou-se que a deformação média observada na segunda, terceira e quarta semanas diferiu, de maneira significativa, da distensão média observada na primeira semana. Comparando-se a segunda e a terceira, a segunda e a quarta, assim como a terceira e a quarta semanas, não foram observadas diferenças estatisticamente significativas entre si (Tab. 7).

Os resultados encontrados a cada semana, de acordo com o tempo e o grau de estiramento, são apresentados nas Tabelas 1, 2, 3 e 4; e os valores médios e os desvios-padrão do comportamento da variável deformação, de acordo com a semana e o grau de estiramento, estão dispostos na Tabela 5.

Com o objetivo de avaliar se o comportamento médio da deformação foi semelhante em todas as semanas, uma vez que se rejeitou a hipótese de que a deformação média, em pelo menos uma semana, sofreu influência da porcentagem de afastamento dos pinos, foi utilizado o teste de igualdade dos coeficientes de inclinação, adotando-se o nível de significância de 5% (p = 0,0556). A magnitude dessas diferenças pode ser observada na Tabela 6, na coluna do coeficiente de inclinação. Além disso, na referida tabela, é apresentado o comportamento médio do estiramento ao longo dos níveis de afastamento para cada uma das semanas. O “intercepto” significa a estimativa de deformação média, em milímetros, em cada uma das semanas, independentemente da distância. O “coeficiente de inclinação” é a variação média obtida em uma unidade de distância (10%). Independentemente da distância na primeira semana, tem-se uma deformação média de 0,0479mm a cada 10% de estiramento, ou seja, para se ter a deformação média de 10 a 50% de estiramento ou de 20 a 60%, multiplica-se 0,0479mm por 5 e obtém-se a deformação de 0,23mm. Na segunda semana, a deformação foi de 0,0564mm; na terceira, de 0,0530mm e na quarta, de 0,0544mm.

A partir da ANCOVA tem-se, inicialmente, que, para todas as semanas, a deformação média depende linearmente (Fig. 3) da porcentagem de estiramento dos

pinos (p < 0,001), ou seja, em pelo menos uma das semanas a deformação média sofreu influência da porcentagem de estiramento dos pinos (variável independente).

Uma vez que não se rejeita a hipótese de falta de paralelismo, foram comparadas as distensões médias entre as semanas (distâncias entre as retas ajustadas). Os resultados podem ser observados na Figura 4.

Na comparação das deformações médias foram detectadas diferenças estatisticamente significativas somente na primeira semana. Na Tabela 7 encontra-se a comparação da deformação média em cada uma das semanas.

No presente trabalho foi possível constatar que o percentual de degradação da magnitude de força aumenta à medida que aumenta o tempo de imersão, observando-se, porém, uma inversão estatisticamente não significativa entre as médias da segunda e da terceira semanas (Tab. 5 e Fig. 4).

 

 

 

 

DISCUSSÃO

Para que sejam eficientes em sua função, os elásticos em cadeia devem exercer magnitude de força adequada por um determinado período de tempo10. Todavia, sabe-se que esse material não possui a capacidade de desenvolver magnitude de força contínua por um longo período de tempo, pois suas propriedades elásticas são alteradas, trazendo deformação permanente e, consequentemente, a perda de tensão. A incapacidade do material elástico retornar ao seu tamanho original após sofrer substancial deformação e ser liberado da tração que a promoveu é definida como “deformação plástica” ou “permanente”4. Os efeitos dessa deformação plástica são manifestos pelo decréscimo na capacidade de liberação de força desses materiais15.

As cadeias elastoméricas do presente estudo foram avaliadas semanalmente, durante um período de quatro semanas, para verificar seu comportamento no intervalo entre consultas4,8,9,12,17, pois esse período coincide com o período médio de troca dos elásticos praticado pelos ortodontistas2. O fator tempo é de grande importância para os elásticos em cadeia, pois sabe-se que uma de suas principais propriedades — a de dissipar forças com magnitude constante durante sua aplicação clínica — sofre influência direta do período em que os elásticos estão sendo utilizados por causa da perda de tensão e consequente degradação da magnitude de força18. No presente estudo observou-se diferença estatisticamente significativa entre a deformação média da primeira semana e as demais (Tab. 7), o que sugere, sem considerar a biologia do movimento dentário, ser conveniente a troca semanal dos elásticos em cadeia, haja vista que as comparações entre a segunda e a terceira semanas, entre a terceira e a quarta, bem como, entre a segunda e a quarta, não apresentaram diferenças significativas. Todavia, é recomendado que a troca seja feita a cada três semanas6,13 e que os elásticos em cadeia não sejam empregados por um período maior que quatro semanas, isso não somente pela degradação da magnitude de força, mas também pela dificuldade de higienização e pelo consequente acúmulo de restos alimentares13. Além disso, o uso desses materiais não deve ultrapassar o período de 6 semanas, pois os elásticos chegam a perder, em média, 30% da magnitude de força inicial, além ocorrer acúmulo de placa bacteriana e interação química com alimentos e fluidos bucais11.

Em relação ao tempo de imersão em saliva artificial, o percentual de degradação da magnitude de força aumenta à medida que aumenta esse tempo1,9,24, o que pode ser constatado no presente trabalho, observando-se, porém, uma inversão estatisticamente não significativa entre as médias da segunda e da terceira semanas (Tab. 5 e Fig. 4).

No que se refere à quantidade de distensão dos elásticos em cadeia, a degradação da magnitude de força é proporcional ao grau de estiramento a que o elástico é submetido1, o que está de acordo com os resultados encontrados no presente trabalho (Tab. 5 e Fig. 3). Por exemplo, pôde-se observar que, conforme a Tabela 1, com 10% de estiramento obteve-se uma deformação média de, aproximadamente, 8,4%, ao passo que com 100% de estiramento a deformação passou para 56,6%. Sendo assim, do ponto de vista clínico, um questionamento pode ser feito: qual o grau de estiramento recomendável para se conseguir um baixo índice de deformação permanente e aplicar a magnitude de força mais constante possível? Com base nos resultados do presente estudo, pode-se sugerir um estiramento de até 30%, estiramento esse que proporcionaria uma deformação média em torno de 17,9%. Entretanto, é importante ressaltar que esse raciocínio é válido apenas para a marca comercial Unitek/3M, aqui analisada, pois os elásticos em cadeia podem variar em espessura, em propriedade elástica, no processo de fabricação, na adição de pigmentos ou flúor e na distância entre os elos. Esses fatores, agindo isoladamente ou em conjunto, certamente influenciariam tanto a magnitude de força liberada, quanto o grau de deformação permanente apresentados por esses materiais. Portanto, quando de sua utilização, o profissional deverá estar atento em relação aos diferentes aspectos abordados e raciocinar de acordo com o tipo de material que tenha selecionado.

O uso de um tensiômetro é prudente para aferir a magnitude de força inicial, haja vista que, para alguns elásticos com cadeias curtas, quando distendidos em 100% de seu comprimento original, podem produzir magnitude de força excessiva, de cerca de 450 gramas, por isso é recomendada uma distensão de 50 a 75% de seu comprimento original. No entanto, há elásticos que, quando distendidos em 100% de seu comprimento original, produzem magnitudes de força aceitáveis, em torno de 300 gramas3. Com base nisso, recomenda-se que o profissional tenha em sua clínica elásticos em cadeia com pelo menos três distâncias diferentes entre os elos, mas todos com a mesma espessura e de uma única marca comercial. Isso possibilitaria a aplicação da magnitude de força desejada levando em consideração o grau de estiramento recomendado no presente trabalho (30%).

Foi possível observar, ainda, uma deformação permanente entre 50 e 60% quando os elásticos foram distendidos em 100% de seu comprimento original, percentuais esses que se assemelham aos encontrados com elásticos em cadeia da American Orthodontics (54%) em outro estudo15. No entanto, nesse outro estudo, os percentuais encontrados com os elásticos em cadeia da Unitek (76%)15 diferem dos encontrados no presente trabalho. Embora tenha sido feita uma simulação de ambiente bucal, sabe-se que in vivo a dieta do paciente, a composição da saliva, a presença de enzimas bacterianas, as forças mastigatórias, a movimentação dentária, a distância de aplicação da força, a presença de flúor e as mudanças de temperatura poderiam influenciar o desempenho mecânico desses materiais e, consequentemente, alterar os resultados obtidos no presente estudo.

 

CONCLUSÃO

Com base nos resultados, pode-se concluir que:

1) Uma relação direta entre o grau de estiramento e a deformação permanente foi encontrada nos elásticos em cadeia avaliados.

2) Houve percentuais médios de 8,4% com 10% de estiramento, ultrapassando o percentual de 20% (21,3%) quando distendidos em 40%, e chegando a 56,6% de deformação permanente se estirados em 100% de seu comprimento original.

3) O maior percentual de deformação permanente ocorreu durante a primeira semana, não sendo estatisticamente significativo após esse período.

 

» Os autores declaram não ter interesses associativos, comerciais, de propriedade ou financeiros, que representem conflito de interesse, nos produtos e companhias descritos nesse artigo.

Como citar este artigo: Yagura D, Baggio PE, Carreiro LS, Takahashi R. Deformation of elastomeric chains related to the amount and time of stretching. Dental Press J Orthod. 2013 May-June;18(3):136-42.

Enviado em: 10 de julho de 2009 – Revisado e aceito: 29 de março de 2010

Endereço para correspondência: Denise Yagura

Rua Visconde de Nassau, 650 – Apto 802 – Zona 07

CEP: 87.020-0230 – Maringá/PR

E-mail: denise_yagura@hotmail.com

 

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