Dental Press Portal

Características auditivas de indivíduos com disfunção temporomandibular e deformidades dentofaciais

Objetivo: investigar se há relação entre os sintomas otológicos, vestibulares, achados audiológicos e o tipo de disfunção temporomandibular (articular, muscular e misto), e verificar a distribuição do grau de disfunção da DTM nessa população.

Métodos: estudo retrospectivo, envolvendo 30 pacientes com deformidades dentofaciais diagnosticados com DTM, de ambos os sexos, entre 18 e 49 anos de idade, submetidos a avaliação clínica (palpação muscular, ausculta da articulação temporomandibular durante os movimentos mandibulares e mensuração da movimentação da mandíbula), exame audiológico (audiometria tonal limiar e imitanciometria) e a dois questionários, sendo um sobre sintomas otológicos e vestibulares e outro anamnético da DTM. A partir do questionário anamnético e da avaliação clínica, os sujeitos foram divididos conforme o tipo e o grau da disfunção da DTM (leve, moderado e severo), e comparados quanto à ocorrência dos sinais e sintomas auditivos, vestibulares e achados audiológicos, de acordo com o tipo de DTM.

Resultados: houve maior prevalência (83,33%) de DTM severa de acordo com questionário anamnético. Sujeitos com DTM mista apresentaram mais queixas de hipoacusia do que aqueles com DTM muscular (p < 0,05). Os resultados evidenciaram ausência de alterações nos exames audiológico e imitanciométrico para todos os indivíduos avaliados.

Conclusão: sintomas auditivos estão presentes nos sujeitos com DTM e deformidades dentofaciais, independentemente da classificação da DTM (articular, muscular ou mista), e aqueles com DTM mista podem apresentar maior ocorrência de queixa de hipoacusia do que sujeitos com DTM muscular. Estudos futuros são necessários para investigar a relação entre a sintomatologia auditiva e os diversos tipos de DTM.

Palavras-chave: Transtornos da articulação temporomandibular. Transtornos da audição. Audiometria. Má oclusão.

 

INTRODUÇÃO

As disfunções temporomandibulares (DTM) correspondem a um conjunto de sinais e sintomas clínicos de etiologia multifatorial, caracterizadas por dor na articulação temporomandibular (ATM) e/ou no tecido que a envolve, limitações funcionais na mandíbula ou estalos durante a movimentação da ATM13. A classificação utilizada, segundo os critérios da Academia Americana de Dor Orofacial18, diferencia as DTMs em grupos conforme a etiologia anatômica, sendo, respectivamente: desordem articular, incluindo a superfície articular, o disco intra-articular ou o osso articular; desordem muscular, envolvendo os músculos mastigatórios que envolvem a ATM; ou mista, quando há sinais de DTM articular e muscular12.

Vários são os fatores associados à etiologia das DTMs, tais como distúrbios da oclusão; das bases ósseas maxilar e mandibular; problemas degenerativos; fatores traumáticos; alterações musculares, como hiperatividade ou hipoatividade; estresse e problemas emocionais; assim como modificações funcionais e hábitos nocivos que geram sobrecarga persistente na ATM ou na musculatura1,12. Embora a literatura seja divergente quanto à real influência da má oclusão na ocorrência de DTM, o trabalho de revisão de literatura de McNamara et al.15 relacionou grupos específicos de diagnóstico de DTM a fatores oclusais, como mordida aberta anterior esquelética, overjet maior que 6 ou 7mm, diferença entre a relação cêntrica e a máxima intercuspidação habitual maior que 4mm, mordida cruzada unilateral e ausência de cinco ou mais elementos dentários posteriores. Quanto às más oclusões de Angle, Thilander et al.27, correlacionaram as Classes I, II e III com a prevalência de DTM, e verificaram maior frequência de DTM no grupo com Classe III. Porém, a análise de revisão sistemática da literatura de estudos longitudinais realizada por Mohlin et al.16, não verificou associações clínicas e significativas entre as diferentes más oclusões, tratamentos ortodônticos e sinais e sintomas de DTM.

As queixas e sintomas auditivos, como otalgia, zumbido, hipoacusia, sensação de plenitude auricular e vertigem, são frequentemente correlacionados à presença das DTM(s)9,11,19,20,21,24,26,28,30.

Vários estudos foram realizados com o propósito de compreender a etiologia dos sintomas auditivos em indivíduos com DTM, tendo sido primeiramente descrita por Costen6. O autor sugeriu que o mal posicionamento do côndilo da mandíbula, ocasionado pela perda de suporte dentário posterior, poderia causar bloqueio da tuba auditiva e sintomatologia de otalgia, zumbido e vertigem. Posteriormente, Myrhaug17 afirmou que a tensão e a compressão das estruturas que conduzem o som proporcionam o aumento da impedância, causando, algumas vezes, sensação de plenitude auricular de característica flutuante associada ao zumbido. Porém, Penkner et al.20 demonstraram que espasmos nos músculos mastigatórios não prejudicam a função do músculo tensor do véu palatino e da tuba auditiva.

Mais recentemente, outros trabalhos encontraram associação entre dor à palpação do côndilo da mandíbula e a presença de otalgia em sujeitos com DTM8,11,24. Também foi verificada alta prevalência dos sintomas de zumbido e vertigem nessa população9,28,30, bem como plenitude auricular8,14,25, que pode estar relacionada tanto ao quadro de DTM como à presença de tensão muscular29, e dor à palpação nos músculos mastigatórios14.

Quanto aos limiares auditivos em sujeitos com DTM, a literatura aponta rebaixamento dos limiares das vias aéreas nas frequências de 6.000Hz e 8000.Hz25. No entanto, também foi encontrada ausência de alterações nos testes audiológicos e maior incidência de imitanciometria normal9.

Embora muitas pesquisas descrevam a sintomatologia auditiva presente em indivíduos com DTM, poucos estudos correlacionaram o tipo de disfunção (articular, muscular ou mista) com sinais e sintomas auditivos. Entre eles, o de Tuz et al.28 não verificou predileção entre a ocorrência de sintomas de otalgia, zumbido, vertigem e perda auditiva entre sujeitos classificados como portadores de DTM articular, muscular e mista, porém, encontrou prevalência maior de queixas nessa população comparativamente ao grupo controle.

Nesse intuito, tendo em vista que a má oclusão esquelética pode ser um fator contribuinte para a DTM, o objetivo do presente estudo é caracterizar a função auditiva de indivíduos com DTM e deformidades dentofaciais para cada um dos três grupos de DTM: articular, muscular ou mista (articular e muscular), e verificar a distribuição do grau de disfunção da DTM (leve, moderada ou severa) na população estudada.

 

MATERIAL E MÉTODOS

Foram selecionados para a presente pesquisa 30 sujeitos, de ambos os sexos, na faixa etária de adulto jovem, que apresentavam diagnóstico clínico de disfunção temporomandibular, mediante aplicação do eixo I dos Critérios Diagnósticos de Pesquisa em Disfunção Temporomandibular (RDC/TMD)7, e que apresentavam deformidades dentofaciais caracterizadas por má oclusão esquelética Classe II ou Classe III de Angle.

Os critérios de exclusão abrangeram indivíduos com histórico de distúrbios neurológicos centrais ou periféricos, tumores ou traumas na região de cabeça e pescoço, exposição ao ruído e diagnóstico de deficiência auditiva prévia. Esse estudo foi realizado na Universidade Sagrado Coração (USC), sendo aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa com Seres Humanos (protocolo n° 077/2003).

Os indivíduos foram selecionados a partir da análise dos prontuários de pacientes atendidos na Clínica de Cirurgia Bucomaxilofacial do curso de Odontologia da referida USC. Tais sujeitos haviam sido submetidos a uma avaliação clínica odontológica e a dois questionários, sendo um o índice anamnético (IA)4,5, baseado numa modificação do índice anamnético de Hélkimo10, utilizado anteriormente por Conti et al.4, a um nível de significância de 5%, e outro questionário que investigou sobre histórico de sintomas vestibulares e otológicos.

A avaliação clínica foi realizada pelo mesmo examinador, devidamente treinado e calibrado, e considerou a mensuração da abertura e lateralidade máximas da boca, presença de deflexão ou desvios mandibulares, palpação das ATM(s), análise de ruídos articulares e palpação bilateral dos músculos temporal, masseter, digástrico posterior, pterigóideo medial, esternocleidomastóideo e trapézio superior. A partir dos aspectos investigados na entrevista e da avaliação clínica, os indivíduos com DTM foram diagnosticados e classificados segundo os critérios da Academia Americana de Dor Orofacial18.

• GI: Grupo com DTM articular – presença de deslocamento de disco, limitação de máxima abertura da boca (menor ou igual a 35mm), deflexão ou desvios mandibulares, dor espontânea e/ou à palpação na ATM; exclusão dos casos com sinais de DTM miogênica.

• GII: Grupo com DTM muscular – relato de dor na região dos músculos mastigatórios durante exame funcional e/ou palpação muscular; exclusão dos casos com sinais de DTM artrogênica.

• GIII: Grupo com DTM mista – presença de sinais de DTM muscular e articular.

Desse modo, GI (DTM articular) foi formado por 10 sujeitos, sendo que sete apresentavam oclusão tipo Classe II de Angle e três sujeitos Classe III. O GII (DTM muscular) foi composto de 10 sujeitos, havendo quatro demonstrando Classe II e 6 com Classe III, e, finalmente, o GIII (DTM mista) continha 10 sujeitos, sendo 6 com Classe II e quatro com Classe III.

No índice anamnético foram investigados os seguintes aspectos: dificuldade na abertura bucal, na lateralidade da mandíbula, desconforto ou dor muscular ao mastigar, presença de dor e/ou cansaço muscular, percepção de ruídos na ATM, dor de cabeça, dor cervical ou nos ombros, dor de ouvido (otalgia) ou próximo a eles, uso de apenas um lado da boca para mastigar, dores na face ao acordar, e se o sujeito considerava sua mordida normal5,12,26. Foram oferecidas três possibilidades de respostas: “sim”, “não” e “às vezes”, sendo que cada “sim” valia dois pontos, as respostas “às vezes” valiam um ponto, e as respostas “não” valiam zero. Os itens relacionados à presença de dores de cabeça com frequência, dores de ouvido ou próximo a ele e presença de ruídos na ATM, equivaleram a três pontos quando foram referidos bilateralmente ou intensamente4. A somatória dos pontos permitiu a classificação dos sujeitos em não portadores de DTM (0 a 3 pontos), DTM leve (4 a 8 pontos), DTM moderada (9 a 14 pontos) e DTM severa (15 a 23 pontos)4.

Para a averiguação específica da sintomatologia otológica e vestibular, os sujeitos foram entrevistados por uma fonoaudióloga, visando a presença dos seguintes sintomas: vertigem e/ou tontura, zumbido, plenitude auricular, otalgia e hipoacusia. Foram, ainda, submetidos à avaliação audiológica na Clínica de Educação para Saúde (CEPS), em Bauru/SP, em salas devidamente equipadas e tratadas acusticamente. Os sujeitos foram submetidos aos exames de meatoscopia, audiometria tonal, logoaudiometria e imitanciometria, utilizando audiômetro GSI-60 e imitanciômetro AZ7.

A audiometria tonal determina a menor quantidade de energia acústica audível (limiar auditivo)23, por meio da análise dos limiares auditivos das vias aérea e óssea de cada frequência, utilizando-se tons puros que são gerados por dois fones de orelha monoaurais. O sujeito é orientado a levantar a mão para o avaliador sempre que ouvir o sinal de estímulo. O avaliador reduz o tom da intensidade do sinal, de forma decrescente, em valores de 10 em 10 dBNA, até encontrar o limiar auditivo, devendo haver confirmação da resposta em 50% das quatro tentativas de estimulação, e considerando-se como valor de normalidade o limiar auditivo de, no máximo, 20 dBNA24.

A logoaudiometria é um teste de discriminação de fala, sendo que, para o presente estudo, foram avaliados os parâmetros do teste Speech Reception Threshold (SRT), no qual o estímulo da fala tem a intensidade reduzida até se encontrar a menor intensidade na qual o sujeito consiga discriminar 50% das palavras que lhe foram ditadas; e do índice de reconhecimento de fala (IRF), no qual o sujeito deve repetir uma lista com 25 palavras monossílabas (para cada orelha), em uma mesma intensidade, 40dB acima da média do limiar tonal das frequências de 500, 1000 e 2000KHz23.

A imitanciometria representa um teste indireto da função tubária, capaz de avaliar a pressão aérea estática e dinâmica da orelha média. Esse exame mede a capacidade da membrana timpânica de refletir um som introduzido no meato acústico externo, em resposta a graduais modificações de pressão no mesmo espaço, verificando, portanto, a permeabilidade do sistema tímpano-ossicular à passagem de uma onda sonora dentro dos padrões de normalidade23.

Os critérios utilizados para a definição de alterações nos exames audiológicos foram os seguintes: limiares tonais aéreos (nas frequências de 250Hz, 500Hz, 1.000Hz, 2.000Hz, 3.000Hz, 4.000Hz, 6.000Hz e 8.000Hz) e ósseos (nas frequências de 500Hz, 1.000Hz, 2.000Hz e 4.000Hz) maiores que 20dBNA; GAP aéreo-ósseo maior que 10dBNA; índices de reconhecimento de fala (IRF, monossílabos) inferiores a 92%; SRT com valores acima de 20dB; curva timpanométrica desviada a partir de -100daPa; reflexos acústicos contralaterais superiores a 115dBNA (ausentes); diferença entre o limiar tonal aéreo e o limiar do reflexo menor do que 60dBNA, o que seria sugestivo de recrutamento9.

A análise dos dados foi realizada por meio da estatística descritiva, paramétrica e não paramétrica. Para se comparar a ocorrência de sintomas auditivos e vestibulares de acordo com os três diferentes grupos de DTM, foi aplicada a Análise de Variância a um critério de classificação, adotando-se o índice de significância de p < 0,05. Para a comparação dos grupos de DTM quanto à severidade da disfunção da ATM, aplicou-se o teste não paramétrico de Kruskal-Wallis, considerando p < 0,05. Para averiguação dos resultados timpanométricos, utilizou-se o teste de Friedman, considerando p < 0,01.

 

RESULTADOS

Foram incluídos no estudo 30 indivíduos de ambos os sexos, sendo 24 mulheres e 6 homens, na faixa etária de 18 a 49 anos (média de 27,3 ± 7,05 anos), divididos em três grupos: GI (10 indivíduos com DTM articular), GII (10 indivíduos com DTM muscular) e GIII (10 indivíduos com DTM mista).

Quanto ao índice anamnético foi verificada uma prevalência maior de sujeitos apresentando sintomas severos de disfunção para os três grupos de DTM estudados, conforme demonstrado na Tabela 1, não tendo sido encontrada, no entanto, diferença estatisticamente significativa (p = 0,069) entre esses. Quanto aos sintomas de disfunção moderada, verificou-se a ocorrência de um (10%) sujeito do grupo GI e três (30%) do GII. A disfunção leve somente foi verificada para um (10%) sujeito do GI.

Os indivíduos dos grupos de DTM articular (GI), muscular (GII) e mista (GIII) foram questionados quanto aos sintomas auditivos e vestibulares, cujos resultados se encontram apresentados no Gráfico 1, onde o zumbido e a vertigem foram referidos pela grande maioria dos indivíduos. Além disso, a otalgia e a hipoacusia foram relatadas em menor ocorrência para os indivíduos com DTM muscular. A análise estatística demonstrou que indivíduos com DTM mista apresentam mais queixas de hipoacusia quando comparados a indivíduos com DTM muscular (p = 0,0581).

Com relação à audiometria tonal limiar, os sujeitos dos três grupos de DTM avaliados apresentaram, para ambas as orelhas, limiares auditivos no intervalo entre 5 e 20dBNA, para todas as frequências de via aérea testadas (Tab. 2).

Na avaliação audiológica dos limiares de via óssea, todos os sujeitos avaliados apresentaram valores compatíveis com a normalidade e apresentaram GAP aéreo-ósseo menor que 10dBNA para todas as frequências avaliadas.

Na logoaudiometria, o índice de reconhecimento de fala encontrado para todos os indivíduos demonstrou valores entre 96% e 100% de acerto, estando de acordo com as referências de normalidade, assim como foram verificados resultados normais no SRT (entre 0 e 20dBNA) para toda a amostra. A avaliação imitanciométrica demonstrou prevalência significativa (p = 0,0001) de curva tipo A, representando resultados compatíveis com os valores de normalidade.

 

v18_n05_70_grf01

 

DISCUSSÃO

Nesse estudo, os pacientes foram subdivididos em grupos conforme a classificação da DTM (articular, muscular e mista) e a severidade da disfunção (leve, moderada e severa), tendo o propósito de melhor elucidar a relação dos sinais e sintomas auditivos e vestibulares com os diferentes tipos de DTM.

Na amostra estudada, verificou-se maior ocorrência de DTM no sexo feminino (80%) do que no masculino (20%), sendo essa prevalência muito próxima dos valores descritos na literatura, uma vez que muitos estudos têm demonstrado que os sinais e sintomas de DTM são mais comuns em mulheres na faixa etária de 20 a 39 anos2,17,20,21,26. Das 24 mulheres avaliadas na presente pesquisa, verificou-se DTM em 15 (50%) na faixa etária de 20 a 29 anos, resultado, esse, que corrobora os obtidos por Williamson29 e Felício8.

Existe, ainda, a hipótese de que a degradação da cartilagem e do osso articular, em decorrência da chegada da menopausa e provenientes do aumento do estrógeno e da prolactina17, possam estar relacionados à presença de sintomas de DTM em mulheres na faixa etária de 40 a 49 anos, tendo sido observada tal sintomatologia em duas (6,67%) mulheres dessa faixa etária na amostra estudada.

No que se refere ao grau da disfunção, 25 sujeitos (88,33%) da amostra, entre os diferentes grupos estudados, apresentaram sintomas severos de DTM. O estudo de Penkner et al.20 verificou maior prevalência de disfunção moderada, seguida de severa, entre os sujeitos com DTM avaliados. Keersmaekers et al.11 também realizaram mensuração da sintomatologia na DTM por meio da aplicação do índice de dor e disfunção10, e verificaram maior predominância significativa do grau severo de disfunção nos indivíduos com DTM concomitante à queixa de otalgia, quando em comparação aos sujeitos sem queixa de otalgia. Por outro lado, Silveira et al.26 verificaram maior índice de severidade de DTM leve, seguida de DTM ausente, moderada e severa, respectivamente, em uma amostra de pacientes atendidos em ambulatório otorrinolaringológico, utilizando-se do mesmo questionário anamnético da presente pesquisa. Conti et al.5 investigaram a associação entre a má oclusão (Classe I e Classe II), o tratamento ortodôntico, a prevalência e a severidade de sinais e sintomas de DTM em 200 adolescentes. Verificaram que 34% da amostra apresentou sintomas leves, conforme o índice anamnético aplicado, enquanto 3,5% eram moderados. A falta de concordância na literatura em relação ao predomínio do grau de DTM pode estar relacionada às distintas condições apresentadas pelos sujeitos dos estudos citados, sendo importante considerar que essa pesquisa investigou indivíduos com deformidades dentofaciais.

Quanto aos sintomas auditivos e vestibulares, verificou-se que mais da metade dos sujeitos de cada grupo estudado apresentou sintomas de vertigem e/ou tontura, zumbido e plenitude auricular. Pereira et al.21 também observaram prevalência de 65% de queixas de zumbido, otalgia e plenitude auricular em pacientes com DTM, assim como Parker e Chole19 encontraram prevalência significativa de queixas de zumbido e vertigem em pacientes com DTM. Um estudo realizado por Tuz et al.28 também subdividiu os sujeitos conforme os tipos de DTM, e verificaram que não houve predileção de sintomas auditivos de otalgia, zumbido, vertigem e perda auditiva entre os grupos de DTM muscular, articular ou misto, porém esses foram relatados em prevalências maiores do que no grupo controle de sujeitos sem DTM. Entretanto, Felício et al.9 encontraram relação entre sujeitos com dores severas na musculatura e na ATM, e propensão a otalgia e zumbido.

Segundo a literatura, a queixa de plenitude auricular pode ser decorrente de alterações musculares em pacientes com DTM, como o espasmo do músculo pterigóideo lateral, que levam à hipertonia do músculo tensor do tímpano, causando alterações no ciclo de abertura da tuba auditiva e levando à redução na ventilação da orelha média17; porém, o estudo de Penkner et al.20 contesta essa hipótese por meio da avaliação eletromiográfica. Já a sensação de zumbido e dos demais sintomas otológicos, como a otalgia e a hipoacusia, têm sido relacionados à presença das DTM(s) em diversos estudos, existindo quatro possíveis modelos que explicariam a etiologias dos sintomas e sinais otológicos nas DTM(s): embriológico, muscular, comunicação óssea e rede neural22.

No presente estudo, indivíduos com sintomas articulares associados ou não a musculares, apresentaram maior ocorrência de queixas de otalgia e hipoacusia, embora a perda auditiva tenha sido descartada pela realização dos exames audiológicos, concordando com Ciacanglini et al.3, que também verificaram associação significativa entre a severidade da artropatia e a percepção de sintomas auditivos. Tais queixas podem ser justificadas pela íntima relação entre a ATM, cavidade timpânica e a tuba auditiva2, onde a influência de alterações na contração dos músculos estapédio e malar sobre a cadeia ossicular da orelha média e a membrana timpânica, originada pelo tracionamento do disco articular, poderiam causar impacto sobre a percepção auditiva, estando a queixa de otalgia relacionada aos efeitos excitantes centrais e mecanismos neuromusculares envolvidos no processo de DTM22.

O presente estudo observou ausência de alterações nos testes audiológicos, concordando com a literatura8,20, e encontrou função tubária adequada (curva tipo A) para todos os indivíduos, também verificada em demais estudos8,20. Contudo, é discordante de estudo semelhante25, que verificou rebaixamento dos limiares das vias aéreas nas frequências de 6.000Hz e 8.000Hz em indivíduos com DTM.

Vale considerar as limitações desse estudo, no que se refere à heterogeneidade dos tipos de deformidades dentofaciais em cada grupo estudado, como também a ausência de grupo controle, com equilíbrio dentofacial. Trabalhos futuros serão conduzidos nessa direção, na tentativa de melhor compreender as relações entre má oclusão, disfunção temporomandibular e sinais e sintomas auditivos e vestibulares.

 

CONCLUSÃO

O presente estudo verificou que os sintomas auditivos estão presentes nos sujeitos com disfunção temporomandibular e deformidades dentofaciais, independentemente da classificação da DTM (articular, muscular ou mista), e que sujeitos com DTM mista podem apresentar maior ocorrência de queixa de hipoacusia do que sujeitos com DTM muscular, entretanto, não sendo constatada perda auditiva nos exames audiológicos ou alterações timpanométricas observadas na população avaliada.

Ressalta-se a importância da realização de estudos futuros que investiguem a possível relação entre a sintomatologia auditiva e a classificação das DTM(s), dispondo-se de uma casuística maior, uma vez que esse trabalho é um estudo preliminar.

 

 

Como citar este artigo:

Totta T, Santiago G, Gonçales ES, Saes SO, Berretin-Felix G. Auditory characteristics of individuals with temporomandibular dysfunctions and dentofacial deformities. Dental Press J Orthod. 2013 Sept-Oct;18(5):70-7.

 

Enviado em: 17 de novembro de 2009 – Revisado e aceito: 27 de abril de 2011

 

» Os autores declaram não ter interesses associativos, comerciais, de propriedade ou financeiros, que representem conflito de interesse, nos produtos e companhias descritos nesse artigo.

 

Endereço para correspondência: Giédre Berretin-Felix

Alameda Dr. Otávio Pinheiro Brizolla, 9-75.

Vila Universitária, Bauru/SP – CEP: 17012-901

E-mail: gfelix@usp.br

Sair da versão mobile