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Bactérias na gengiva podem atrapalhar ritmo cardíaco

Uma bactéria comum em casos de doença gengival pode estar contribuindo silenciosamente para o aumento de problemas cardíacos. Pesquisadores da Universidade de Hiroshima, no Japão, descobriram que a Porphyromonas gingivalis (P. gingivalis) — responsável por quadros severos de periodontite — pode invadir a corrente sanguínea, alcançar o coração e provocar acúmulo de tecido cicatricial, alterando sua estrutura e funcionamento. O achado foi publicado na revista científica Circulation.

O estudo aponta uma possível ligação entre a infecção oral e a fibrilação atrial (FA), uma arritmia cardíaca potencialmente grave que pode levar a acidente vascular cerebral, insuficiência cardíaca e até à morte. Segundo os dados mais recentes, os casos de FA aumentaram de 33,5 milhões em 2010 para aproximadamente 60 milhões em 2019 em todo o mundo.

“Embora ainda não tenhamos estabelecido uma relação causal definitiva entre periodontite e fibrilação atrial, a disseminação de bactérias orais pela corrente sanguínea pode explicar essa conexão”, afirma o professor assistente Shunsuke Miyauchi, primeiro autor do estudo.

A pesquisa foi conduzida com modelos animais e humanos. Em experimentos com ratos, os cientistas introduziram a cepa W83 — altamente agressiva — da P. gingivalis na polpa dentária de um grupo, enquanto o outro permaneceu saudável. Ao longo de 12 a 18 semanas, os animais foram monitorados.

Os resultados mostraram que, após 18 semanas, os ratos infectados apresentavam seis vezes mais chances de desenvolver fibrilação atrial em comparação com o grupo controle. A presença da bactéria no átrio esquerdo do coração foi confirmada por testes genéticos, e os tecidos afetados exibiam sinais claros de fibrose — um enrijecimento causado pela formação de cicatrizes.

“Nos ratos expostos, já observamos aumento significativo da cicatrização do tecido cardíaco a partir da 12ª semana, o que se intensificou ao longo do tempo”, destaca Miyauchi.

A equipe também analisou amostras de tecido cardíaco de 68 pacientes humanos com fibrilação atrial que passaram por cirurgia cardíaca. A P. gingivalis foi detectada em maior quantidade nas pessoas que também apresentavam periodontite avançada.

Essa descoberta reforça a hipótese de que a infecção bucal pode ter efeitos sistêmicos mais amplos, indo além da cavidade oral.

A P. gingivalis tem uma habilidade peculiar: consegue invadir células do corpo humano e se esconder do sistema imunológico, evitando sua destruição por autofagossomas — estruturas responsáveis por eliminar agentes nocivos. Dentro das células, ela permanece ativa, promovendo inflamação e formação de cicatrizes.

Nos ratos infectados, os pesquisadores identificaram o aumento de marcadores associados à fibrose, como a proteína galectina-3 e o gene Tgfb1, envolvido na resposta inflamatória.

Higiene bucal
Diante dessas descobertas, os autores do estudo reforçam a importância dos cuidados com a saúde bucal, não apenas para evitar infecções locais, mas também como forma de proteger o sistema cardiovascular.

“Escovar os dentes, usar fio dental e manter consultas odontológicas regulares pode reduzir significativamente o risco de translocação da P. gingivalis e, consequentemente, ajudar a prevenir a fibrilação atrial”, destaca Miyauchi.

Segundo ele, o tratamento da periodontite pode ser uma estratégia importante na prevenção de doenças cardíacas.

A equipe de Hiroshima agora busca compreender melhor os mecanismos pelos quais a bactéria afeta as células do coração. Além disso, os pesquisadores pretendem fortalecer a integração entre medicina e odontologia, iniciando um modelo colaborativo na província de Hiroshima para diagnóstico e tratamento conjunto de doenças cardiovasculares e orais — com o objetivo de expandir essa prática para todo o Japão.

Sobre o estudo
Além de Miyauchi, o estudo contou com a colaboração de pesquisadores de diferentes departamentos da Universidade de Hiroshima, incluindo especialistas em bacteriologia, patologia oral, medicina periodontal, medicina cardiovascular e cirurgia. A pesquisa amplia o entendimento sobre como infecções bucais podem repercutir de forma sistêmica e aponta caminhos para prevenção de doenças graves.

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