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Alberto Consolaro: “Nico e neuralgia, desespero e esperança”

Por: Alberto Consolaro

Nico é uma abreviatura, que às vezes pode dar esperança a quem tem uma das piores dores humanas representada pelas neuralgias faciais, especialmente a neuralgia do trigêmeo, o nervo que dá sensibilidade à face. A Osteonecrose Cavitacional Indutora de Neuralgia (Nico) tem outros 75 nomes na literatura.

Não sabemos exatamente o que provoca a neuralgia do trigêmeo, mas há várias teorias como lesões induzidas pelo vírus do herpes simples, do zoster e outros. Mas pode ser atribuída à distensão excessiva do nervo e até à compressão externa. Não sabemos exatamente o que provoca, mas sabemos que é uma dor insuportável para o paciente, que até pensa em suicídio.

A dor é paroxismal, ou seja, em agulhadas rápidas e repetitivas. A doença é unilateral e quase sempre tem uma zona de gatilho acionada por estímulo, desencadeando um ataque de minutos ou horas de muito sofrimento, como fossassem descargas elétricas.

Um estímulo sensorial na zona de gatilho pode ser o toque mecânico, o vento, o frio, o sol, etc. Diante deste desespero de dor, o paciente se apega a qualquer esperança e a Nico é uma delas. Poderia ser uma área focal radiolúcida irregular nos maxilares ocupada por uma necrose óssea que faria uma cavidade que levaria ao estímulo de provocar uma dor neurálgica como a neuralgia do trigêmeo e outras neuralgias faciais. Dizem, que têm casos que nem se vê alterações imaginológicas, mas estaria lá do mesmo jeito.

Se aparecer uma imagem radiolúcida irregular e analisar-se ao microscópio, quando curetada, não se observa cavidade e nem mesmo áreas de necrose tecidual, mas sim um tecido conjuntivo fibroso infiltrado difusamente por células inflamatórias. Pode ter edema e até osso desorganizado em alguns pequenos pontos. Encontra-se também tecido adipócitos, normalmente encontrado nos espaços medulares dos ossos. Mediadores inflamatórios como citocinas, claro, também estão no local.

Estas áreas podem estar presentes nos maxilares, mas eh mais lógico que representem focos residuais ou reacionais e até cicatriciais de antigas lesões de doenças periapicais, periodontais e pericoronárias de dentes que foram um dia extraídos, e até dos dentes decíduos.

O patologista não consegue caracterizar uma lesão de perfil específico chamada de Nico. Não se tem uma osteonecrose que seria uma necrose óssea com ausência de bactérias e nem se tem cavidade óssea no local. O que o patologista vê é um processo inflamatório localizado difuso inespecífico, além de muito discreto. Se tiver bactérias é osteíte ou osteomielite.

Muitos pacientes têm estas mesmas lesões sem que tenham neuralgia do trigêmeo. E muitos pacientes, quase todos, com neuralgia não têm estas imagens radiográficas. Mas, quando se nota nestes pacientes, nasce uma esperança de que se curetar a área, poderemos ter a cura da neuralgia. A neuralgia do trigêmeo é chamada, na mídia, de a pior dor do mundo.

Quando foi relatada na literatura esta possibilidade, a Nico até ganhou popularidade, mas estudos criteriosos analisando todos os trabalhos sob a luz criteriosa da ciência, infelizmente, não se pode concordar que ela seja uma lesão específica bem caracterizada que possa receber a “culpa” de que seja responsável pela neuralgia do trigêmeo e outras dores faciais. Como entidade clínica ou doença, a Nico inexiste, tal qual sugeriu os alemães Caroline Sekundo e equipe, na prestigiosa revista europeia Oral Diseases, em 2022.

REFLEXÃO FINAL
A experiência pessoal não têm critérios científicos e os relatos de casos esporádicos também não se sustentam cientificamente, mas, se algum pesquisador abraçar a Nico como uma hipótese válida, seria muito interessante criar uma casuística padronizada e estatisticamente significante para chamá-la de evidência científica. Infelizmente, pelo que temos até hoje, o conceito e o diagnóstico laudado de Nico, ainda não é possível de ser feito.

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